quarta-feira, 20 de outubro de 2010

o embate

Esta semana estreio mais uma peça. Meu amigo Caco Galhardo, diante de meu convite para a estreia da terceira peça do ano, perguntou se eu estava abrindo uma pastelaria de peças. Não, retruquei na hora, não tem franquia, nem pastelaria, faço todas com igual afinco, é que teatro é assim mesmo, quando a maré está baixa, é uma seca total, e quando enche, todos os peixes vêm de uma vez só. Mas voltando ao "Rancor", minha personagem é uma jornalista, e por isso andei por algumas redações e consegui um convite para o debate no último domingo por que achei que seria um bom laboratório. De fato foi. Um lugar surreal, onde, apesar de todos os artificialismos, regras, imposições e interesses, me senti no meio de uma ágora grega, em pleno debate democrático. Quanta fúria, bagunça, ímpetos,controvérsias e excesso de opinião.

Os candidatos, que já se mostravam cansados na tv, pessoalmente pareciam mais cansados ainda. Nos intervalos seus assessores assemelhavam-se a treinadores de boxe colocando protetores de dentes e jogando água e auto-estima em cima de seus pupilos. Mas o mais interessante era ver a reação do outro candidato enquanto ouvia a resposta do seu adversário. Sim, por que na tv não tem contra plano em debate, mas pessoalmente é interessante ver um presidenciável ouvindo secamente seu oponente e matutando novas réplicas durante o discurso alheio. E a platéia! Quanto ruído, quantos blocos de anotacão, cliques de câmera, gunhidos, risos e onomatopéias soltas no ar; um capitulo a parte, sessenta segundos por minuto conectado ao twitter. Intercalava momentos de alta tensão com outros de extrema falta de educação. Kennedy Alencar, o mediador, pedia silêncio, mas de nada adiantava, o público não se continha. E eu não sabia ao certo como me portar. Antes de sair de casa estava com um vestido alegre, verde gritante. Já na frente do espelho do elevador, lembrei que não poderia ir com ele, imaginei uma platéia de homens e mulheres em ternos pretos e blazeres azuis marinhos. Me vi no meio deles, de verde limão. Voltei para o armário. Uma camisa vermelha. Não. Uma vestido azul. Não. Qual cor seria mais imparcial que o preto? E foi assim que me vesti, de negro, acompanhada da minha amiga Bel Coelho, do outro lado o governador, na frente de um senador e atrás de uma boa dúzia de políticos que costumo ver diariamente nas páginas do jornal. Eu, não mais atriz do que muitos que ali estavam, um peixe fora da água, a paisana, tentando me comportar da forma mais natural possível, segurando uma vontade gigante de gritar como se grita num campo de futebol.

Passei o tempo todo boquiaberta com o jogo, admirando algumas falas, me entediando com outras e torcendo. Para quem, não vem ao caso. O fato é que política é um negócio emocionante, um negócio feio, bonito também, e é só para quem tem muita vontade e sangue frio.

E eu, que costumo chorar só de ouvir os primeiros acordes do hino nacional, que me emociono quando alguém pronuncia a palavra pátria na minha frente, nunca contive tanta expectativa, espanto e riso diante do futuro do meu país.

2 comentários:

  1. Bem interessante! Mais ainda saber que você tem mais uma estréia...

    Merde pour toi.

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  2. Continue assim..se entusiasmando pelo amor a 'arte". abço.

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