sábado, 23 de janeiro de 2010

set


O set é uma espécie de Vaticano, tem leis próprias que independem do mundo lá fora, uma hierarquia absolutamente necessária, visível e uma espécie de áurea sagrada em volta dele. Quando você está num set todas as outras coisas da sua vida parecem estar fora de foco, nubladas e distantes. E lá dentro você faz coisas como fumar prestando atenção em não mostrar a marca do cigarro, fica atenta na posição dos seus cotovelos antes de desmanchar uma postura, tem olhos em voltas do pescoço, equilibra microfones no sutiã, dá suas falas nos intervalos de aviões, olha para pedaços de fita crepe como se olhasse o horizonte, se equilibra em saltos apertados, almoça com espartilhos ou outros figurinos bizarros, comuns, enfim, cada set é um set, mas em todos você invariavelmente espera e toma café sem parar. Agora tudo isso é perfumaria, porque o que você de fato foi fazer ali é uma coisa maior. É como se você fizesse toda a trilha para Machu Pichu a pé, passasse dias esperando, andando com os pés calejados e uma mochila carregada nas costas, tudo, tudo para chegar no lugar onde a vista é mais bonita e ter cinco minutos de deslumbramento.

Cinema é mais ou menos isso, você espera, ensaia, maquia, espera, entra na luz, sai da luz, espera, retoca a maquiagem, passa o texto, espera, fica imóvel, concentra, perde a concentração, retoma, espera, olha ao redor, respira e finalmente toda aquela parafernália de luz, gente e som silencia para que você possa dar vida a um personagem que nasceu por acaso na cabeça de alguém, talvez numa tarde chuvosa como esta. E nestes poucos minutos em que a cena é o centro do mundo, alguma coisa acontece, uma coisa que eu não sei direito explicar, mas que justifica todo resto.

Eu estive "presa" num set semana passada e por isso não estive aqui, e estive feliz, porque adoro fazer cinema, gosto de toda essa confusão, essa meticulosidade, tudo em volta, quando tudo começa e finalmente termina.

Terça parto para Berlim e volto na quarta-feira de cinzas, que me pareceu um bom dia para marcar a passagem de volta. Parece que é o inverno mais frio dos últimos trinta anos, parece que venta muito. Mas, bom, como já tenho meu casaco da viagem para a Rússia, me sinto um pouco menos apavorada. Se alguém estiver a passeio pela região me avise, vamos falar português e comer algo estranho e apimentado juntos. Menos chucrute. Então tá, escrevo de lá!

Lá em cima na foto, eu e Cynthia Falabella, parceira adorável de cena, no set. A foto é do Ravel Cabra e Jorge, que também acabou passando por lá.

7 comentários:

  1. Que lindo Martha!! Que vontade de sentir essa coisa sem nome que nos invade em película!! Adorei o texto, boa viagem e a gente se vê na volta! Bjs!! Vanessa Goulartt

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  2. Vanessa querida, que bom vc por aqui! bjs e até já...

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  3. Oi Coraçãooooo.......se cuidada por lá hein? te espero com boas notícias.

    Beijos,
    Iris

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  4. Vc acabou de traduzir todas as sensações que tive/tenho com o cinema!
    para ator, é um "esquenta/esfria" o tempo todo. E às vezes é cruel fazer a personagem apenas entre o "acão e corta". aahhhhhh, mas tb é tão bom...
    como se fosse possível controlar o tempo, recriá-lo, ou melhor, inventá-lo!
    estarei em Berlim tb! Com Gilda, Silvinha e outros brazukas perdidos.
    bjs

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  5. Oi Martha! vim agradecer o recado e aproveitar pra desejar boa viagem!
    Quais são previsões de trabalhos por aqui? Quero conhecê-los! bjs

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  6. lindo texto. nem uma vírgula a mais nessa descrição. ah ! talvez caiba aqui um suspiro de identificação quando termina-se essa leitura. beijos.

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