terça-feira, 17 de maio de 2011

wild

Chego em Moscou exausta, depois de atravessar fuso- horários e muitas horas de viagem. O aeroporto cheio de homens de terno me mostrando os catálogos de seus táxis, bancos quebrados, seres desalojados e pessoas com buquês de flores esperando outras pessoas.

Bem Moscou.

Esperei até as três da manhã, tentando escapar dos motoristas de plantão, que insistiam em falar em russo comigo, até meu amigo Charly chegar.

É difícil escrever sobre a Rússia. Adoro Moscou, mas me irrito com a selvageria local. Um país inflamável. A qualquer momento as coisas podem se tornar estranhas, incômodas e incendiárias. Os russos têm uma violência inata, misturada a uma pureza fora do tom. Você pode, do nada, levar uma bronca de um local sem entender o por quê. Aliás, isso é bem comum, broncas na rua. Gentilezas também acontecem, inusitadamente.

O que eu mais gosto na Rússia, é o que os russos mais detestam. A mistura do velho com o novo. Num momento podemos estar num restaurante karaokê georgiano, tomando vodka em doses cavalares, acompanhada de conservas e brindes longuíssimos da velha geração. Entramos na terra e submergimos em profundas estações de metrô e na hora seguinte estamos numa boate lotada de jovens que pensam de forma absolutamente diversa.

Você pode argumentar que em qualquer lugar as coisas são assim. Mas na Rússia, por motivos que não sei explicar, isso é mais evidente. Uma distância abismal entre o velho e o novo. Um país antigo cedendo lugar ao futuro. Um futuro destrambelhado, como um ator que só maquia metade do rosto e entra em cena sem perceber. Assim a Rússia. Um lugar enorme, cheio de gente com roupas que você nunca imaginaria que alguém pudesse usar na rua, cheia de teatros, lugares vinte e quatro horas, avenidas larguíssimas. Você estende o braço e tanto um mercedes, quanto uma lata velha podem parar para negociar uma corrida. Decorei alguns números, trezentos, cem, quatrocentos, e com um mapa na mão pude negociar minhas caronas. A primavera coloca as pessoas na rua, os canteiros estão cheios de tulipas novinhas e cheiro de esterco de terra recém semeada.

O café é terrível, a lógica das coisas um enigma, mas um sorriso brasileiro pode resolver qualquer parada.

Encontramos muitos novos amigos e em todos os encontros o Charly nos anunciava da seguinte maneira “ Estamos aqui, do lado de um edifício estranhíssimo, perto da metrô, na saída do parque. Eu tô com uma casaco preto, sou alto, bonito, e tô com minha amiga Martha, um tipo bem brasileiro. E você, está vestido como?”

Imagino que todos esperavam uma mulata maravilhosa quando se depararam com o meu tipo brasileiro desbotado. De qualquer forma, é bom ser morena nos países onde prevalecem as loiras.

No mais, entre muito mais, andei a pé até esfolar todos os cantos do meu pé. E uma vontade de parar o tempo. Em todos os lugares do mundo, por cinco minutos, só para respirar e olhar. Todas as coisas, os detalhes. Antes que elas mudem de cara novamente.

2 comentários:

  1. Olá Martha,

    Acho que você captou bem um pouco da alma moscovita, essa mistura do velho com o novo vem de antes da queda do comunismo, é tão inerente ao espirito russo quanto uma certa melancolia em meio aos porres homéricos de vodka.

    Dizem que em Moscou se pode encontrar, com a mesma facilidade, uma never-ending party ou uma briga demolidora de bares.

    Mais uma vez, parabéns pelo blog!

    Bjs, Chuck

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